18.7.11

fim de jogo


“Final del juego” é um conto de Cortázar em que três meninas – supostamente irmãs, vivendo com a mãe, a tia e o gato – têm como “reino” os fundos da casa, onde praticam o jogo de se fingirem de estátuas e de encenar “atitudes” (estados de espírito) para os passageiros do trem que passa sempre à mesma hora. São elas Letícia, a mais velha e mais meiga, com uma espécie de paralisia infantil que imobiliza as costas; Holanda e a narradora, ambas cúmplices na picardia, na energia e na graça que Letícia parece não ter.
Cortázar mostra-nos a vida familiar das meninas com uma verossimilhança psicológica e uma precisão de voz (da narradora em primeira pessoa) que comovem. Pela maldade das meninas com o gato, pelo desprezo pela mãe e a tia, faz-nos prever um jogo perverso e trágico, para na verdade mostrar apenas que se trata de personagens com os sentimentos, as fraquezas e a complexidade de qualquer jovem.
O jogo e a maneira como as três meninas o praticam – alternam-se sorteando quem será a imitadora da vez e o que encarnará – formam o centro do conto. Tudo se precipita quando um passageiro (um estudante) passa a lançar bilhetes da janela, comentando as estátuas e atitudes. Mostra-se particularmente fascinado por Letícia – “la más linda es la más haragana” (preguiçosa) – cuja deformidade se escondia na imobilidade das estátuas. Chega a pedir para encontrá-las, mas é recebido somente por Holanda e a narradora, já que Letícia não quer revelar-se na frente dele. É desse fascínio do menino por Letícia e do ciúme que provoca nas outras duas que nasce a tensão e a força da história.
O final é tão bonito quanto o resto do conto. Letícia faz chegar uma carta ao menino explicando sua condição e, como numa despedida do jogo, faz um gesto triunfal, catártico: “levantó los brazos como si en vez de una estatua fuera a hacer una actitud, y con las manos señaló el cielo mientras echaba la cabeza hacia atrás (que era lo único que podia hacer, pobre) y doblaba el cuerpo hasta darnos miedo. Nos pareció maravillosa, (...). No sé por qué las dos corrimos al mismo tiempo a sostener a Letícia que estaba con los ojos cerrados y grandes lacrimones por toda la cara.”
Ariel, o menino, a viu assim, uma vez mais, e no dia seguinte “cuando llegó el tren vimos sin ninguna sorpresa la tercera ventanilla vacía, y mientras nos sonreíamos entre aliviadas y furiosas, imaginamos a Ariel viajando del otro lado del coche, quieto en su asiento, mirando hacia el río con sus ojos grises.” 

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