10.5.11

axolotl


“Axolotl” é um conto fantástico-existencial de Julio Cortázar. É a história de um homem que visita o Jardin des Plantes de Paris e entra numa espécie de transe de identificação com os axolotl que habitam o fundo do aquário. Pensei inicialmente que o elemento fantástico do conto começava com a própria invenção desse animal de nome asteca, mas os axolotl existem realmente, são uma forma híbrida de peixe e lagarto que passeia com patas de lagartixa e nada com ondulações de serpente. O fantástico está em que o visitante pensa descobrir o sentido profundo desses animais, que seriam encarnações mudas, mas conscientes, de algo mais secreto e misterioso – uma natureza humana aprisionada, um antigo domínio do mundo.
A graça do conto está na maneira como Cortázar o constrói. Narrada em primeira pessoa, a história vai revelando aos poucos a transformação viviva pelo narrador, que da observação dos animais passa à identificação e finalmente à encarnação de um axolotl. O narrador se transformará no axolotl que ele observa, ou seja, a descoberta do sentido profundo daquele animal é que o animal é o observador mesmo, que em dado momento passa a pensar e a olhar de dentro do aquário.
Cortázar faz isso de maneira sutil e elegante. Vai introduzindo frases que prenunciam a transformação, comentários que já indicam o pensamento de um axolotl humano: “Los axolotl se amontonaban en el mezquino y angosto (sólo yo puedo saber cuán angosto y mezquino) piso de piedra y musgo del acuario.” Prepara-nos para o final redentor, em que o pensamento humano, axolotlano, migra para dentro do aquário, enquanto aquele que observa de fora, o visitante de sempre, parece perder seu sentido e sua sensibilidade, como uma máscara sem rosto ou pensamento.
É inútil querer decifrar todos os possíveis sentidos por trás dessa idéia engenhosa de Cortázar. O conto vale pela idéia fantástica em si, pelo transe do visitante que encontra uma mensagem profunda no rosto triangular e nos olhos transparentes do axolotl: “Su mirada ciega, el diminuto disco de oro inexpresivo y sin embargo terriblemente lúcido, me penetraba como un mensaje: ‘Sálvanos, sálvanos.’ Me sorprendia musitando palabras de consuelo, transmitiendo pueriles esperanzas.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário